KARAPOTÓ LIVRO MEMÓRIA
NO COMEÇO ERA ASSIM
A região do Rio Opara que conhecemos como Vale do São Francisco era habitada muito antes da colonização europeia por diversas nações indígenas, conhecidas pelos estudiosos, entre as tribo os Karapotó com várias denominações étnicas nas grafias registradas na história, Karapotis, Karapotas, Krapotós, Karapoti, Kapotó etc… Este povo viviam na Mata Atlântica na faixa litorânea chegando até o interior na Caatinga pelo Rio Opara ( Rio São Francisco ), gente aguerrida em constantes lutas com outros grupos da região, pelas migrações dos Tupis vindas do Brasil Central antes da conquista portuguesa.Os Karapotó habitaram nestas correrias o Rio Poxim em Pacatuba em Sergipe, Serra do Comunaty em Pernambuco, Rio Boa Cica e Rio Itiuba em Alagoas procurando a abundancia da caça e pesca nas florestas existantes para cosntruir suas aldeias, suas roças. Pelas histórias contadas pelos mais velhos da tribo os Karapotó praticavam uma técnica de pesca usando o Tinguí espécie de veneno que atordoava os peixes, facilitando a captura. O costume da ocupação da terra pela maioria das tribos era de construírem suas aldeias nas margens dos rios, habitando no lugar num período de quatro invernos, logo após este tempo procuravam outro lugar para ficar, e assim de geração em geração. Estas terras de ocupadas pelos Karapotós estava com seus ecosistemas intactos porque os indígenas tiravam só o necessário para sua sobrevivência, na agricultura praticava a Coivara a derrubada de um pequeno pedaço de mata, queimando em seguida para plantar suas roças, nesta atividade estes indígenas mais se destacavam, plantavam milho, abóbora, amendoim, mandioca, macaxeira, algodão, fumo e urucum. Entre as comidas do cardápio nativo a mandioca base da alimentação dos Karapotó, preparam o beiju, tapioca, bolo de maça puba e principalmente a farinha. Nas caças mais consumidas a paca, cutia, veado, teiú, tatu e capivara, mas as aves como a nambu, nancupé e zabelê, esta tribo tinha muitos caçadores conhecedores do comportamento animal. Imitavam muito bem os animais de caça, faziam arremedos de aves para facilitar as caçadas. Muitas destas caças foram extintas nesta região após a ocupação europeia. Gostavam sempre de habitarem próximos as lagoas com fontes de argila para a confecção da cerâmica, mas esta atividade não é mais praticada pelas mulheres atualmente após longo convívio com com os portugueses e missionários.
CHEGADA DOS BRANCOS
No começo da chegada dos Povos Brancos, foi de amizade com os indígenas, iniciou as trocas com objetos machado, panos, espelhos por pau-brasil juntos aos indígenas do litoral no litoral nordestino. A Mata Atlântica de nosso território tinha muita abundancia desta árvore apreciada pelos europeus, que utilizavam os indígenas para o corte e transporte de toras até os navios. Mas a maior devastação de nossas florestas foi mesmo a Cana-De-Açúcar, com a implantação da Capitania de Pernambuco tinha seus limites o Rio São Francisco, foi umas das mais prósperas da Colônia portuguesa. Nessa época teve a escravidão indígena para arrumar a mão de obra para a plantação de cana nos engenhos, os bandeirantes caçavam os índios, destruíram as aldeias inteiras, mataram muitos guerreiros nas tribos. Houve a Guerra contra os Caetés no Rio Cururipe, os massacres imposto pela Coroa Portuguesa aos indígenas chegou a outras tribos entre eles os Kariri, Karapotós e outros grupos. Na verdade esta estratégia de ocupação era para desocupar a Terra e colocar os engenhos para produzir açúcar, com isso o enriquecimento a custa do sangue indígena. Os Caetés em sua maior parte foram massacrados, outros fugiram para o Norte para outros lugares onde a civilização não havia chegado. As tribos que viviam nesta região do Vale, não tiveram mais sossego com as Bandeiras, tinha o Rio São Francisco como caminho para chegar ao interior do Brasil, encontravam muitas aldeias vulneráveis a ambição portuguesa. Aqui fica muito perto do litoral, o Rio Francisco deságua no Mar, ficava muito fácil chegar a nossas aldeias que habitavam nas margens do Velho Chico e seus afluentes, Rio Boa Cica, Rio Itiúba, Rio Tibirí etc..Aos poucos as matas foram sendo derrubadas a aparecendo engenhos em todo lugar, com isso foi chegando muitos brancos com suas doenças que não existia aqui bexiga, peste, gripe dizimavam aldeias inteiras . Cada vez mais a população indígena foi diminuindo, fomos dominados pela força das armas, doenças, morte pelos portugueses destruindo nossas matas, desestruturando as comunidades, praticar as tradições ficou cada mais difícil, porque não tínhamos tempo praticar nossa religião nativa.
DE MISSÃO EM MISSÃO
Na ocupação de Sergipe teve uma grande Guerra contra os índios movida por Cristovão de Barros, morreram os caciques Surubim, Serigy, Pacatuba, Japaratuba e muitos outros, assim foi possível a dominação por estas bandas. Os sobreviventes foram aldeados em Missões pela Igreja a cargo da Companhia de Jesus. Os Karapotós foram aldeados em Pacatuba inicialmente, juntamente com outras etnias Caxagós etc…, as mudanças culturais foi muito grande, as aldeias redondas tradicionais passaram a ser em ruas ao redor de uma capela sob invocação de um Santo São Feliz de Pacatuba em Sergipe. Nesta Missão de Pacatuba os Karapotó passaram muitos anos vivendo sobre a proteção da Igreja para não serem massacrados pelas bandeiras, que andavam invadindo as aldeias evangelizadas em busca de escravos para vender em São Paulo. Os Karapotó pode ter sido um Povo grande com muitas comunidades, ou pode ter vivido em várias Missões do Nordeste, porque tempo depois eles estão na Missão de Urubu-Mirim em Alagoas, onde foram evangelizados junto aos Kariri e Aconãs. Na Missão de Urubu-Mirim em Porto Real do Colégio os Karapotós passaram a viver com maior frequência, mas vamos encontrar estes indígenas em outros lugares, porque eram muito arredios . Tempo depois os Karapotós foram encontrados na Serra do Comunaty em Pernambuco junto aos Carnijós, vivendo sobre a proteção da Igreja no Rio Ipanema, parece que eles retornaram para Alagoas junto aos Kariri do São Francisco, por serem povos de cultura pesqueira, com argila nas lagoas para a cerâmica , além da água boa e a Mata Atlântica com fartura de caça. O trabalho nas Missões era como uma escravidão para os índios, aprenderam as artes e ofícios do plantio de arroz, olaria, confecção de selas de couro, sapatos, e agricultura capitalista. Mais o maior sofrimento dos índios foi a proibição da fala da língua nativa substituída pela língua portuguesa e Latim, Religião Católica imposição de um Novo Deus desconhecido pelos nativos desta terra, a autoridade do Pajé foi rebaixado agora o Padre era o Chefe Espiritual, o Cacique foi retirado e colocado o Capitão-Mor Chefe Militar para dar segurança a Missão e a Povoação.
FAZENDA BOA CICA
No Sertão do Nordeste tinha um clima propício para a pecuária, no Vale do São Francisco com abundancia de pasto natural da Caatinga tornou-se o “ Rio dos Currais”, ao longo de suas margens grandes propriedades foram se formando as fazendas centenárias para fornecer carne as outras capitanias. O Colégio Jesuíta do Recife Centro Catequético administrava as Missões localizadas na Capitania de Pernambuco, tornou-se possuidora de muitas fazendas ao longo do Rio São Francisco, doadas por devotos. Nas missões eram reunidos em aldeamentos várias etnias para facilitar a ocupação portuguesa e evangelização da igreja. Na Missão de Colégio região de Urubú-Mirim sob a invocação de Nossa Senhora da Conceição, foram reunidos no aldeamento os indígenas Kariri, Karapotó e Aconã,no século XVII. Muitas propriedades foram doadas para a Missão de Colégio uma dessas Fazendas Urubu-Mirim foi uma doação de Antonio Souto de Macedo ficou sendo o Centro Administrativo da Igreja. Outras fazendas Boa Cica, Itiúba, Ribeira das Cabaças, Panema, Maraba no total de 11 propriedades foram doadas a Nossa Senhora da Conceição. A região era muito grande para a Missão de Colégio administrar, os indígenas foram usados como mão de obra para cuidar da criação de gado, os Karapotó foram enviados para a Fazenda Boa Cica, onde os índios do sexo masculino passava a maior parte do ano trabalhando, as mulheres ficavam na Missão de Colégio na Fazenda Urubu-Mirim. Os Karapotó pediram aos Jesuítas para enviar suas mulheres e filhos para a Fazenda Boa Cica, porque longe de seus familiares sentiam saudades e muitos sofriam, assim foi atendido o pedido, onde fizeram uma pequena aldeia ao redor de um pé de tinguí , onde ficou conhecida por Aldeia Tinguí do Povo Karapotó no Rio Boa Cica. Ao longo do tempo o nome Tinguí foi confundido com o nome da etnia, mas na verdade Tinguí era a denominação do local onde os indígenas habitaram.
EXPULSÃO DOS JESUÍTAS
Na época do Brasil Colônia a Igreja ficou poderoso com inúmeras propriedades, as brigas eram constantes entre missionários e portugueses, pela posse da terra, com esses acontecimentos os indígenas ficou cada vez mais vulneráveis a ocupação . O Primeiro Ministro de Portugal decretou a expulsão dos Jesuítas as propriedades da Igreja foram leiloadas e vendidas anos da Missão de Colégio de Urubu-Mirim foram deportados os padres Nicolau Botelho e João Batista, a maioria das fazendas foram compradas pelo Capitão Vieira de Antão ou ( Dantas ). Agora as suas terras passaram para fazendeiros, colonizadores legalizados pela Coroa Portuguesa. Os indígenas passaram a viver sob o medo também de serem expulsos, massacrados pelos novos donos das terras, foi isso que exatamente aconteceu, os brancos protegidos pelo Poder Imperial cada vez mais atacavam os índios em suas aldeias. Os Karapotó permaneceram no Boa Cica para ficar na terra trabalhavam como mão de obra barata aos fazendeiros , mas continuavam praticar seus rituais as escondidas para não serem identificados como indígenas. A ligação dos Karapotó com o Povo Kariri-Xocó vem de antiga data, sempre os indígenas visitavam o ritual um do outro, nestas andanças tinha casamentos de etnias, fortaleciam os laços de amizade. O Pajé Manoel Paulo de Colégio da Nação Kariri tinha uma mulher Karapotó por nome de Chiquinha Botó na Aldeia Tinguí, na época do ritual ele lá também ministrava as tradições. Os indígenas cada vez mais foram sendo perseguidos pela política discriminatórias chamando-os de caboclos, isso para tirar os direitos dos índios da terra, ocupando toda a região.
DESTRUIÇÃO DA ALDEIA
No período que Alagoas passou a Província as terras do Rio Boa Cica passaram para mãos de outros proprietários, um deles o mais poderoso do Baixo São Francisco o Barão de Penedo, dominava vasta extensão do território, onde os indígenas estavam localizados, começou a perseguir os Karapotó e outras etnias ao longo de todo o vale. Cada vez mais os indígenas foram sendo dominados pela força das armas, os lideres perseguidos e mortos, as terras legalizadas a favor do invasor, os índios perderam seu território. A Aldeia Tinguí dos Karapotó foi destruída pelo Barão de Penedo no Século XIX, as ocas e casas de palhas foram incendiadas, os indígenas foram expulsos da terra, uma outra parte da população passaram a viver entre os brancos, obrigados a viver como eles, tiveram que negar suas origens e seus direitos. Os Karapotó passaram trabalhar como mão de obra para fazendeiros e senhores de engenho na região. Com a destruição da aldeia os Karapotó fundaram o Povoado Terra Nova, que ali passaram a viver sem praticar os rituais, porque ali foi chegando muitos brancos. Para continuar seus rituais muitos Karapotó foram habitar Porto Real do Colégio também em Alagoas, o Pajé da Aldeia Kariri-Xocó Francisco Queiroz Suíra bisneto do Pajé Manoel Paulo, recebeu seus parentes já nos meados do Século XX, onde passaram a viver em paz. Os Kariri de Porto Real do Colégio estava reconhecido pelo S.P.I. Serviço de Proteção aos Índios, no Posto Indígena Padre Alfredo Damaso .A outra parte dos Karapotó ficaram morando ainda no Povoado Terra Nova, mas tinha um sonho de reaver suas terras.
LUTA PELO RECONHECIMENTO
Com a identificação de muitos grupos indígenas pela FUNAI ( Fundação Nacional do Índio ), ressurgiu vários grupos étnicos que haviam escondido suas origens no período do Brasil Império , agora com novos ânimos apoio de outras comunidades, o Cacique Juarez Itapó dos Karapotó passou a reunir todo seu povo que estavam espalhados pela região para juntos buscar o reconhecimento étnico. Organizando a comunidade os Karapotó fizeram várias viagens a Brasília, com inclusive envio de Grupo Técnico para identificação do território, mas a criação da Reserva Indígena Karapotó foi na época do Governo Collor, as terras estava na mãos dos Fazendeiros. O Povo Karapotó ocuparam a Fazenda Coqueiro, logo após pediu o apoio de outras comunidades indígenas do Nordeste, e vieram os Guarani e Tupiniquim do ES, Pataxó Hãhãhãe da BA, Xucurú-Kariri e Kariri-Xocó de Alagoas, Xucurú e Fulni-o de PE, Potyguara da PB, Xocó de SE, Tapeba do CE , juntos fizeram uma retomada da Fazenda Taboado a maior propriedade que estava no Território Karapotó. A luta foi muito grande, os indígenas foram expulsos por uma liminar do Juiz Federal, passaram 17 dias nas margens da BR 101, impacientes por uma decisão os Karapotó retornaram a Fazenda Taboado e conseguiram finalmente a posse permanente da mesma, o fazendeiro Luiz Coutinho foi indenizado, os indígenas construíram a aldeia, o Rio Boa Cica banha as terras dos Karapotó, as suas águas correndo para o Rio São Francisco , as matas agora estão ressurgindo cobrindo a paisagem toda de verde da esperança .